O Ponto
Aventura 12+ anos

O parêntese esquecido

por Fernando Madruga
O parêntese nasceu para conter o que é dito entre suspiros. Uma pausa delicada, um comentário ao pé da frase. Mas, em tempos de vozes altas e certezas gritadas, ele foi esquecido — talvez por ser educado demais para sobreviver na era das exclamações.
A humanidade, cansada de ouvir, passou a falar em linha reta. Tudo direto, urgente, sem nuance. O parêntese, coitado, tentou avisar que há sempre um porém, um depende, um talvez, mas ninguém quis ouvir. A pressa é surda.
Antigamente, as pessoas abriam parênteses para expressar empatia: “(ele errou, mas está tentando)”, “(ela sofre, mas disfarça bem)”. Agora, só há espaço para sentenças definitivas — e para os likes que as validam.
As redes e seus tribunais digitais exterminaram o benefício da dúvida. Cada frase é um veredito, e cada comentário, um apedrejamento público embalado por emojis. O parêntese, esse símbolo de humanidade, perdeu o emprego.
Enquanto isso, o ponto original observa. Vê uma civilização que coleciona opiniões, mas esquece de ouvir o que fica entre elas. O mundo, sem parênteses, é um texto sem alma: tecnicamente correto, emocionalmente analfabeto.
E assim, os parênteses foram se fechando, um a um, silenciosos — não por falta de espaço, mas por falta de respiro.
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