O Ponto
Aventura 12+ anos

As reticências do esquecimento

por Fernando Madruga
As reticências sempre foram o abrigo da dúvida. O espaço entre o que se quer dizer e o que não se consegue. Mas, com o tempo, o mundo foi ficando apressado demais para hesitar.
A civilização do instantâneo não tolera silêncio. Tudo precisa ser dito, publicado, comentado — e esquecido. As reticências, cansadas, foram deixadas para trás, substituídas por pontos finais apressados. O pensamento virou sprint, e a memória, um aplicativo com cache limitado.
Antes, esquecia-se por necessidade. Hoje, esquece-se por hábito. Esquecemos promessas, dores, histórias — e, quando não há mais o que esquecer, começamos a esquecer que esquecemos.
As redes sociais reinventaram o esquecimento em alta definição. O passado dura 24 horas no status; a vergonha, 15 segundos no vídeo; a indignação, até o próximo escândalo. A humanidade descobriu como se reinventar sem se corrigir.
As reticências observam tudo do rodapé da gramática, tristes. Sabem que o esquecimento não é apenas perda — é anestesia. E uma sociedade anestesiada não sente, apenas reage.
O ponto original, paciente como sempre, observa o texto da humanidade se dissolver em fragmentos. “Eles aprenderam a falar”, pensa, “mas desaprenderam a lembrar.”
E assim, o mundo segue... ou talvez não siga.
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